terça-feira, 7 de outubro de 2025

  Rosa de Cristal

                                                        



Certa vez em uma terra distante, em uma cidade de fé, existia uma pequena Rosa. Ela era destemida, determinada, sempre querendo resolver as coisas sozinha, mostrar que podia cuidar de si mesma, era muito amada, por aqueles que a criaram, a observando e torcendo por suas vitórias. Ela foi crescendo de forma independente, sua forma forte de ser, passava confiança às pessoas à sua volta, que sempre a julgavam muito maior, do que realmente era. Mas a vida não é um conto de fadas, surpresas e desafios, estavam esperando na caminhada que estava por vir. 


O tempo foi passando e a Rosa foi conhecendo novos sentimentos, descobriu então uma linda habilidade, em transformar o que sentia nas mais belas palavras. Ao mesmo tempo, suas pétalas se tornavam a cada dia que se passava, mais deslumbrantes para aqueles que a viam, enfeitiçados por sua magia, delicadeza e força.


Com esses novos sentimentos, a pequena Rosa começou a descobrir a beleza do amor, como havia sido muito amada desde seu nascimento, imaginava que as outras pessoas também possuíam essa brilhante dádiva. Mas o mundo esconde muitos sentimentos obscuros e às vezes, confundir paixão com amor, pode causar grandes ferimentos. 


Ao entregar seu coração, pensou que seria amada, da mesma forma que conhecia, mas encontrou mentiras e ilusões, desejos egoístas que só queriam sentir o prazer, de desfrutar de sua beleza, de seus sentimentos através de palavras. Esse choque com a realidade, a fez duvidar de tudo, a deixando perdida, sem sentido para continuar. Parecia que o mundo fora do seu jardim, era tão feio, que sujava todas as belas lembranças do passado, que haviam a tornado o que era, ao ponto de querer desistir e foi nesse momento que ele apareceu. 


Um sorriso maroto, um gingado em forma de arte, espalhando ilusões e sonhos, por toda parte. E mesmo despedaçada, a sonhadora Rosa, acreditou ter encontrado, alguém que pudesse valorizar suas palavras, quem ela realmente era. Mais uma vez o tempo foi passando, enquanto ela crescia, pensando estar sendo completada, a magia da dança que parecia tão bonita, não a permitiu ver as correntes, que estavam a rodear.


E assim, o mundo voltava a girar, escondendo segredos, que ninguém podia imaginar.

Muito antes do nascimento da pequena Rosa, um garoto havia crescido por ali, também na cidade da fé, desejando se tornar um paladino, que pudesse proteger todos os sonhos que ele viu desmoronar, mas já nessa época, o mundo rejeitava aqueles que desejavam ser como os antigos heróis, por isso, aquele garoto havia partido, em busca de algum lugar, onde ele pudesse ser valorizado, mas todos os anos longe de casa, apenas o ensinaram várias e várias vezes, que já não é possível encontrar valor, em um mundo, onde o verdadeiro Herói, foi crucificado. 


O Paladino Aposentado, estava voltando para casa, após inúmeras batalhas, onde acabou perdendo tudo. Agora, após reunir suas últimas forças, pensou em recomeçar mais uma vez, onde tudo começou, perto das pessoas que amava. Em sua nova jornada, ele seguia em frente como de costume, mas em uma noite, um brilho roubou o seu olhar. 


Era firme como um cristal 

Delicada como uma rosa

Seu brilho poderia afastar todo o mal

Acalmar um coração, após uma simples prosa.


Mas suas experiências no campo de batalha o fizeram decidir se manter distante, ele sabia que não era o momento para isso, muitas coisas para reconstruir, uma armadura para se revestir, uma espada para forjar, um escudo levantar .


Mas o mundo continua escondendo surpresas e em uma manhã de terça-feira, seus olhos se cruzaram rapidamente, em um lugar inesperado, o paladino olhou mais uma vez, para ter certeza que lá estava ela. A pequena Rosa olhando de volta para ele, como um encontro, predestinado.


Os dias foram passando, o olhar de ambos, acabavam sempre se encontrando, mas as cicatrizes de batalha, ardiam como um aviso, manter distância, já não parecia seguro. Inúmeras coincidências e conexões, algo os levava a um encontro, sentimentos em formas de palavras, encontravam o seu destino, como um sonho despedaçado, que se juntava para brilhar mais uma vez.


E foi então que a Rosa disse para ele, disse que em um sonho, ele invadiu o seu império, quase como um desafio, uma provocação,  o fazendo baixar seu escudo, entrando no campo de batalha mais uma vez, decidido a deixar de fugir, não negar a ele, essa história que ela dizia predestinada.


E assim, o mundo voltava a girar, escondendo segredos, que ninguém podia imaginar.



A Rosa estava confusa, após um longo tempo, ela começava a perceber as correntes que a haviam acorrentado. O Paladino seguia lutando, suas ações e palavras, buscavam romper essas correntes, mas ele não conseguia entender naquele momento, que essas correntes que a prendiam, foram colocadas ali desde o início, mas o ato de se prender, não foi feito por ninguém, além da própria Rosa.


Seus espinhos o amedrontavam, como se  algo estivesse  tentando o expulsar, aquela Rosa sempre fez tudo sozinha, mas ao se prender em correntes, não conseguia ver nada além do que queria ver.  Mas essa dureza que fazia o Paladino tremer, eram quebradas com palavras que diziam o contrário, um poema de despedida, olhares que o desejavam, sentimentos que o encorajaram.  


Mas foi então que ele se viu, perguntando sobre quem a Rosa realmente era, em uma hora o encantava, assim como ele, transformando sentimentos em palavras, despertando desejos que havia pensado ter esquecido, era como se ele soubesse, que poderia ser o melhor dele mesmo, se estivesse em sua companhia. Mas em outra hora, o feria zombando de suas ações, duvidando de suas intenções, do seu propósito, de quem era, de sua melodia.


Ele decidiu se afastar novamente, mas quando ela disse estar apaixonada, ele acabou se embaraçando naquelas correntes, com seus movimentos agora debilitados, ele tentava a libertar, mas quanto mais se mexia, mais se feria, a pedia que também lutasse, mas ela disse ser covarde, disse que nunca se apaixonou, o afastando mais uma vez , ela perderia sem lutar.


Então em uma tarde chuvosa, ele decidiu a acompanhar uma última vez, eles brincavam e falavam bobagens, como se todas as correntes e problemas, tivessem desaparecido. Ela dizia para que ele fosse mais rápido, mas ele continuava andando lentamente, tentando fazer com que aquele momento durasse para sempre, mas no fundo ele já sabia, ao ver que seus cristais estavam fundidos as correntes, que aquele, deveria ser o último passo, de uma dança confusa, de uma Rosa e um Paladino, ambos despedaçados, pelas surpresas de um mundo, cheios de músicos desafinados.




E assim, o mundo voltava a girar, escondendo segredos, que ninguém podia imaginar.






Eles se tornaram tão distantes, como se fossem totais desconhecidos, caminhando em direções opostas, cruzando ruas para não se esbarrar, vivendo mentiras, para que não voltassem a se aproximar. 


O Paladino se perguntava o que aconteceu de errado, parecia que sua forma honrada de ser, sua forma de abraçar, de cuidar, de rejeitar a maldade desse mundo, sua tentativa de ser bom, ajudando a todos que podia, mesmo quando era ele que mais precisava de ajuda, todos seus ideais de justiça, toda sua forma de amar, se tornava alvo da raiva e do ódio da distante Rosa de Cristal, que não desejava abraçar o mundo, pois ele não merecia.


Ele a viu um tanto perdida, não entendeu o que estava acontecendo, ela não estava brilhando como o de costume, seus cristais possuíam várias rachaduras, então naquele dia, ele resolveu ir ao seu encontro, lhe estendendo a mão mais uma vez, ela sorriu, como da primeira vez.


Mas as engrenagens do destino continuavam a girar e em uma noite, ela pediu sua ajuda, ele ficou relutante por um momento, teve medo, ficou apavorado, mas em um sonho, isso já lhe tinha sido avisado, então por mais uma vez, abaixou seu escudo, com a esperança de recomeçar, deixando todo o passado para trás. 


Quando ela  chegou tão frágil, tão sensível, com lágrimas no rosto, ele se  lembrou do por que não fugiu, quando seus espinhos o feriram, na primeira vez. Toda aquela força, toda aquela raiva, toda aquela insegurança, todo aquele medo, toda aquela muralha, aquela frieza, estava tudo no chão, estava tudo em pedaços. Naquele momento, era apenas uma delicada rosa, uma menina que ansiava por cuidado , aceitou o seu abraço, se aconchegou em seu peito.


Desde o início, era por essa rosa que havia se apaixonado, era por essa rosa, que ficou enfeitiçado, aquele olhar de menina, que se escondia atrás da força de uma mulher, cheia de sonhos e um brilho, que o fez ignorar o sentido de malmequer.


Ele a ouviu, não julgou, só queria a proteger, a sentir. Ela parecia tão confortável, confiando toda sua dor a ele, já tinha todas as respostas, sabia todos os seus erros. Ele apenas ficou ouvindo e tentando fazer com que ela parasse de chorar, ela percebia o quanto aquelas correntes a tinham feito mal, o quanto aquelas correntes não a deixam prosseguir, a enraizando em um círculo vicioso, como uma armadilha que a fazia se perder ainda mais, a distanciando do verdadeiro Herói, a tratando como um objeto, com que podia brincar quando tinha vontade. Mas finalmente ela entendia, que apenas ela, pode devolver a poesia, quebrando essas correntes para sempre, podendo fazer, que daquele dia em dia, tudo, poderia ser diferente. 


A noite passou, as lágrimas se foram, mas com a ausência delas, todas as muralhas reluzentes de cristais, se colocaram entre eles mais uma vez. Ele tentou se aproximar, mas os espinhos o perfuraram outra vez, tentando o mandar para bem longe.


Disse que ele não a convencia, mais uma vez o fez sentir incapaz. Então o Paladino se afastou, se perguntando o porquê da Rosa rejeitar seu amor, afinal amor, era tudo o que ele tinha. Já não esperava nada em troca, só desejava o seu bem, mas mesmo assim, era julgado como inimigo.


Uma rosa que cresceu tão livre, acabou solitária, sem ter a quem prestar contas, a quem se justificar, ainda tão pequena, mas com problemas tão grandes, cresceu forte e destemida, mas desprotegida, sendo ferida por pessoas perdidas, vazias e egoístas, pessoas que só procuravam por prazer, por brinquedos, por momentos passageiros. Teria sido então por isso, que passou a duvidar de todos?


São muitas perguntas, que talvez nunca sejam respondidas, mas o Paladino não pode continuar lutando, não pode continuar colidindo contra essa muralha de cristal, pois suas rachaduras ainda abertas, são como lâminas afiadas e ele não pode ajudar, mas como alguém que sempre resolveu tudo sozinha, pode aceitar ajuda? Como alguém que sempre foi traído, pode se permitir confiar mais uma vez?


O Paladino se afasta mais uma vez, colecionando memórias, desses inúmeros dias de dança, uma conexão eletrizante nas escadas, uma faísca tão bela e cintilante. Trocas de olhares que jamais vai esquecer, desejos se chocando, quase a enlouquecer.


E assim, o mundo voltava a girar, escondendo segredos, que ninguém podia imaginar, mas o verdadeiro Herói, observa lá do alto, enquanto as escolhas de uma Rosa de Cristal, apenas Ele pode deslumbrar. 



Chris†offer C. Diniz 03-05-2023